15h48 - quinta, 11/01/2024

O amor e o erotismo


Fernando Fonseca
Sendo verdade a afirmação de que Amor é sentimento, e sexo é acto, entendo que o sentimento só por si, é inconsequente se não se traduzir em actitude. Não única e necessariamente, no acto sexual. O Amor é emoção, mas é mais do que isso; não existindo só por si, necessita de algo a que amar. Esse algo, pode ser de tão diversas naturezas, como o amor à vida, o amor a alguém, o amor á humanidade, o amor à natureza em geral. Mas ele só existe de facto, quando quem ama interage com o objecto do seu amor. Entendo o Amor como uma ideia extensa, em que o amor espiritual é aquele que procuramos alcançar, integrando-o no nosso pensamento e na relação com os outros.
Quanto ao acto sexual apresentado por força dos costumes e de uma certa moral, como não tendo nada ver com a dimensão espiritual, entendo que é intrínseco e indissociável deste. A questão é que, sendo essencialmente biológico, o que geralmente procuramos no imediato é a emoção e satisfação do desejo, próprio e partilhado na concretização do erotismo, esse motor e produtor de hormonas especializadas na produção do "prémio", configurado na sensação de plenitude alcançada no êxtase do orgasmo, prémio comparável à dádiva de néctar que as flores oferecem aos insectos polinizadores, pela sua função na fecundação. O acto sexual constitui o mecanismo da propagação das espécies e não parecendo, está no que aos humanos respeita, ao serviço da dimensão espiritual. Com ele se assegura a propagação da espécie "ad eternu". E aqui, se entende como ambos, espírito e acto, se completam.
"Ad eternu"; para a eternidade; é um ideal circunscrito à experiência da vida enquanto fenómeno pensável. Mas o que entendemos por eternidade, existe a termo certo, embora não nos seja possível conceptualizar temporalmente esse termo; a velha questão da eternidade do Universo. Por definição, eterno é o que não terá tido início nem terá fim. Ora, a teoria científica dominante e aceite pela generalidade das pessoas independentemente do seu credo, é a de que o Universo começou como um "átomo primitivo" (segundo o abade George Lemaître em 1931), denominado a meio do século passado como "Big bang". Tendo tido início, não pode ser considerado eterno, podendo ser, no entanto e até ver, infinito; que é dizer: Teve início, mas não tem fim (ousando teorizar algo que não conhecemos nem tampouco venhamos a conhecer "algum dia").
Acerca da tão comum e simultaneamente misteriosa questão, que uns consideram díspares, e outros indissociáveis, tenho forçosamente de me apoiar em Platão, que cerca de quatro séculos antes do nascimento de Jesus, aprofundou na sua obra Banquete, o entendimento acerca do Amor recorrendo aos diálogos que atribuiu a um grupo de filósofos seus contemporâneos.
Naquela obra, toda a existência para aqueles filósofos, é um acto de Amor, comparando este, ao conceito de Harmonia. Todo o Universo conhecido funciona segundo princípios harmónicos ou do Amor, mesmo quando colapsam estrelas e galáxias. Mas essas mortes cósmicas, mais não são do que metamorfoses, pelas quais, novas e diversas associações dos átomos, o "pó" disperso, são a matéria-prima para o nascimento de astros de nova geração, estabelecendo novas harmonias.
Como os seres "vivos", que detentores das mais diversas manifestações de consciência, acabam no acontecimento que é a morte. Regressam ao "pó" para se transformarem em qualquer outra coisa, na forma de substâncias que mais cedo ou mais tarde, irão integrar outras formas de vida, ciclicamente. (Lei de Lavoisier, séc. XIX).
Disso, fala o Hinduísmo toscamente, mas com uma intuição que se integra na realidade universal.
Voltando a Platão: Quando os oradores discursam os seus entendimentos acerca do Amor, referem-no de dois tipos, emanados pela deusa do Amor, a ambígena Afrodite; o Amor Espiritual ou Celeste inspirado por Artemisa (a divina, que não teve mãe, sendo filha do Céu), e o Amor de Eros, inspirado por Artemisa Polímnia (a do amor popular, gerada por Zeus e Dione). Na primeira, a espiritualidade é a consciência; desenvolve-se e cresce pelo culto do Bem e do Belo e pelo pensamento filosófico, sendo nessa dimensão que nos liberta da condição material, e nos possibilita elevarmo-nos ao nível dos deuses, tornando-nos eternos. Tão eternos que hoje, 2.400 anos depois do "Banquete", consigo ouvir as palavras que o filósofo eternizou. Pois, interpretando o filósofo, todas as culturas de todos os povos, configuram um caminho para a eternidade a que Platão chama a "Escada do Amor".
Mas para que isso aconteça, quer esteja nas nossas intenções ou seja diáfano entendimento, quando partilhamos o acto sexual conduzidos por Eros, independentemente do "prémio" que é o prazer, estamos a construir a persistência da espécie humana, para, pela palavra, essa ferramenta sem a qual não é possível o pensamento, nem a reflexão, nem a construção da sabedoria, passarmos o testemunho do conhecimento, criando as condições para rumar à eternidade.
E assim, estamos a fazer o amor, como os franceses se exprimem em (faire l'amour) ou os ingleses em (making love). Na Verdade, o Amor não se faz; cultiva-se.
Tudo é Amor. E havendo o estímulo, o "prémio", tanto melhor. É que, apesar de nos dominar a emoção de Eros, na verdade não somos mais do que estafetas na corrida para a Eternidade configurada no mito que nos serve de farol, atraindo-nos para essa meta desconhecida: A tão aliciante e sedutora condição divina.

Fernando Fonseca
"Café Paraíso"
Zambujeira do Mar (Odemira)



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