12h32 - quinta, 08/08/2024
A propósito da I Guerra Mundial
António Martins Quaresma
Um amigo recordou-me que neste último fim de julho passaram 110 anos sobre o início da 1ª Guerra Mundial, a Grande Guerra, como muitas vezes lhe chamaram; e sugeriu-me que discorresse a respeito do tema, na próxima crónica do "Sudoeste". Anui e assim estou a fazer, embora sem pretensões de historiar.
Ainda criança, ouvi alguns relatos, de cunho anti-heróico, que meu avô materno, entretanto falecido, transmitira à minha avó. Ele foi, duplamente, uma vítima da mobilização militar: não só integrou um contingente enviado para Angola, como depois, logo que regressou a Portugal, foi enviado para o Norte de França. Conheci também alguns antigos soldados do CEP, um deles de Milfontes, muito loquaz sobre as coisas das trincheiras da Flandres, que achava, puxando a brasa à sua sardinha, que a "sua" guerra fora muito mais dura do que aquela que na altura (anos de 1960) o exército português travava em África. Acho que tinha razão, mas sempre me pareceu que, no fundo, ele queria algum estatuto de herói. O culto dos heróis sempre acompanhou os nacionalismos e os imperialismos.
Em 1914, num clima ultranacionalista e militarista, a Europa, a reboque da Inglaterra e da Alemanha, lançou-se alegremente numa aventura bélica que haveria de resultar numa carnificina com milhões de mortos e uma crise subsequente que conduziria à 2ª Guerra Mundial, com mais uns largos milhões de mortos. A loucura é bem ilustrada pelo assassinato de Jean Jaurès, político socialista e pacifista, francês, por um fanático nacionalista, em Paris.
Como resultado dos avanços tecnológicos, produzidos pela Revolução Industrial, as novas armas revelaram-se extremamente letais e as táticas empregadas nos campos de batalha, pelos generais, pouco preocupadas com as vidas dos soldados, também contribuíram para a mortandade. No fim destas guerras, ganharam os EUA, que se converteram na potência dominante à escala mundial, a situação que agora temos.
Ontem como hoje, os "delegados de propaganda bélica" (paráfrase que li algures), instalados no poder do Estado e apoiados por uma multidão de alienados, desejavam a guerra. Hoje, tropas e equipamentos portugueses encontram-se, se não empenhados em combates, pelo menos em ações militares de vigilância e apoio militar contra um país com quem não estamos em guerra e que não nos ameaça. Na verdade, neste momento, somos um país agressor, fiados na ilusão de que temos "as costas quentes". Tudo porque estamos inseridos numa aliança militar, cuja orientação, além do mais, está a moldar as cúpulas militares deste país. Não dizia um conhecido almirante, que estava pronto a ir morrer longe, referindo-se à situação conflitual que ocorre na Europa? Qualquer dia, tenho poucas dúvidas, vai querer morrer ainda mais longe, no Oriente, quando esse for o comando da "voz do dono". Claro que se ele fosse morrer sozinho, lá pelos seus motivos, não viria grande mal ao país, nem ao mundo. O grande mal é que quando um almirante ou um general vai para a guerra, ele arrasta consigo numerosos soldados, a maioria decerto não possuída da decisão heróica daqueles, mas com muito mais possibilidades de servirem de carne para canhão.
Poderão acusar este escrito sobre a 1ª Guerra Mundial de simplismo e de algum enviesamento. Aceito. Inspirado no que se passou há um século, ele é, principalmente, uma afirmação discordante do belicismo que vai grassando.
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